Minha mãe mandava muito bem na invenção e criatividade das merendas da manhã, da tarde e final da noite (“vamos merendar” é uma expressão comum na Bahia, com significado “vamos lanchar”). Este cardápio era muito variado e com uma dose nutricional forte. Como estas mulheres formadoras de família, sem qualquer conhecimento mais técnico, imprimem com tanta sabedoria uma diversidade alimentar que nos garante uma nutrição adequada e equilibrada? Com certeza, temos ai um saber natural, instintivo, que faz parte da sobrevivência humana, além de uma conduta aprendida através da oralidade e dos gestos transmitidos das avós para mães e filhas.
Uma das merendas deliciosas era a vitamina de abacate, uma simples mistura entre o abacate maduro, leite e açúcar, batidos em liquidificar, na proporção que melhor nos agradar. Gotas de limão opcional. Mais leite para vitaminas mais liquidas, menos leite para vitaminas mais espessas. A dosagem do açúcar sempre foi na mesma medida do afeto destas mulheres – avós, mães, tias, madrinhas – ou seja, em excesso, em doses generosas.
O abacate (avocado em inglês e italiano, avocat em francês, alvocat em catalão, aguacate em espanhol), pseudofruto comestível do abacateiro, cultivado no México e na América do Sul desde 7000 a.C, nas embarcações no século XVII era utilizado como substituto da manteiga, daí também ser chamado de “manteiga de aspirante”, assume várias formas de consumo e preparo em diferentes locais, sendo ingrediente de receitas doces e salgadas.
No Brasil, especialmente no Nordeste, é utilizado em forma de vitaminas ou consumido simplesmente com açúcar. Mais para o Sul o Sudeste do país já encontramos a fruta como ingrediente de saladas e em algumas preparações de patês.
O México tem um prato salgado muito famoso e tradicional, preparado desde os tempos dos Astecas, chamado “guacamole“, feito com abacate e vários temperos, ideal para ser servido com os famosos “tacos” mexicano.
Receita de Guacamole
1 – Ingredientes
- 1 abacate grande e maduro
- 2 dentes de alho amassados
- 2 tomates picados, sem peles e sem sementes
- 1/2 cebola roxa picada
- 4 colheres de sopa de suco de limão
- Coentro e cebolinha picados e a gosto
- Pimenta malagueta e sal a gosto
2 – Modo de Preparo
- O tomate, a cebola, a pimenta malagueta, o coentro e a cebolinha devem ser bem picados;
- Amasse bem o abacate;
- Misture os demais ingredientes;
- Coloque na geladeira por 30 minutos;
- Sirva com tacos, torradas ou pãezinhos.
Na França é uma especialidade, um prato para ser servido de entrada com variados tipos de ingredientes.
Em Londres (Inglaterra) encontramos na rede de fast food EAT (digamos, mais correta e mais saudável – www.eat.co.uk – Oxford St, 68) sanduiches feitos com pedaços de abacate. Esta rede tem um posicionamento muito interessante, pois trabalha com produtos de época, ou seja, apresenta um cardápio condicionado a produção sazonal de frutas, legumes e verduras.
Diferente, entretanto, é encontrar produto industrializado tendo o abacate como matéria prima. Confesso que não conhecia nada igual. Sempre acreditei no abacate como uma fruta de convivência doméstica, restrita aos preparos culinários das cozinhas caseiras e restaurantes. O Avocadoil (www.avocad-oil.com) é um azeite de abacate, extra virgem, produzido em Israel, 100% elaborado a partir do abacate. É indicado para ser consumido da mesma forma que o tradicional azeite de oliva. O Avocadoil é muito sedutor do ponto de vista sensorial. Apresenta cor verde intensa, sabor com personalidade própria, enraizado na fruta abacate e levemente mais denso que o azeite de oliva.
Nosso abacate foi definitivamente industrializado, rotulado e disponível em larga escala nas gôndolas dos supermercados, uma “característica da nossa sociedade contemporânea em transformar tudo em mercadoria. Por conseguinte, nesse processo de universalização a nossa experiência alimentar também vai virar mercadoria, o alimento vai virar mercadoria, e então vai surgir a contradição entre mercadoria e cultura”*, onde a simples cultura do consumo da fruta abacate de forma caseira vai assumindo uma identidade industrial a partir da transformação em produtos diversos. Não será surpresa, em breve, outros produtos – biscoitos, massas, doces, geleias – industrializados a partir do abacate, e que não seja surpresa também, crianças de um futuro próximo acharem que abacate é algo envidraçado ou plastificado, assim como, hoje, uma galinha é um cubinho de caldo… “mãe olha uma Knorr”, gritava uma criança para sua mãe diante de uma galinha “de verdade”.
*Marcelo Carvalho – Cultura e Alimentação/ Saberes Alimentares e Sabores Culturais – O Alimento: Do espaço provido à mercadoria – Edições SESC/SP – 2007.